segunda-feira, 17 de março de 2014

Agonia

Ah, saudade, por quê me fazes sofrer,
Fazendo-me gritar no silêncio desconfortante da indiferença?
Por que ainda os grilhões que me oprimem não foram tirados de mim?
Diante à incumbência de viver trancafiado dentro dos meus medos,
Sem ao menos dar-me ao prazer de dizer tudo o que penso, vivo.
Vivo, ou melhor, tento - já que a falta da sensatez,
É o pagamento do grito que permeia a calmaria
Que me obriga a dá-lo sem ao menos confortar-me
Nos deleites insepultos da verdadeira paixão.
Ah, saudade, saudade.
Não me firas mais, porque aqui jaz um amante desolado.

- Heitor Dávila

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Há alguém?

Eu sempre precisei da multidão para esvaziar-se-me. É uma sensação estranha que me preenche a alma. É como se os meus pensamentos só fluíssem pelas minhas veias no silêncio do travesseiro. Não posso escolher. Preciso dos bancos de uma praça. Lá eu encontro um sossego. A multidão me consome. Os olhares que pairam pelo ar sugam-me. Os corações que mesmo sem o encontro já batem em uníssono alegram-me. Os beijos deveras apaixonados elevam-me. As gramáticas dos amores inventados fazem-me voar. É um estado de transcendência: a minha solidão não existe, os meus pensamentos habitam sabe-se-lá-quem, o amor que em mim existe, encontra a estrela mais cálida. Mas à medida que a multidão começa a esvair-se e ir ao encontro das suas casas velhas, meus pensamentos voltam a tumultuar-me, minha solidão volta-se contra mim. Mas eu sou amante da solidão. Eu a admiro, pois é nesse estágio letárgico do amor que eu a encontro. Eu sou um paradoxo.

Anoiteceu. Eu estava só. Ou me sentia só. Não sei. As estrelas começaram a desenhar-se no enegrecido firmamento. E por um momento, eu me senti preenchido. Mas nada havia. Apenas me havia. E havia também minha vontade. Minha ânsia de viver o êxtase do amor. Ao banco senti um calafrio. Senti um sussurro ao pé do meu ouvido. Eu estou ficando louco? Talvez eu tenha me tornado um insano por amar demasiado sem ter a quem amar. Talvez. Mas essa voz queria me dizer algo. Esse calafrio seria um coração chegando, o qual eu o zelaria com todo o meu amor? Não sei. Nem poderei saber. A voz parecia de uma multidão perambulando sem vida em busca de nada. E eu contemplava a abóbada celeste. E pensava comigo, Será que há alguém com os mesmos anseios, correndo em paralelo comigo? E gritava para mim. Gritava despudoradamente para o Universo, Se há, por favor, quero encontrá-la, preciso encontrá-la, preciso amá-la com todo o meu amor, amá-la livremente; e dizer que a amo, dizer que a amo através dos meus cânticos emudecidos pela solidão.

O Universo não me respondia. E eu não escutava a voz de nenhuma menina. Será que há alguém? E será que eu não cansarei de buscar? Já andei demasiado. Já visitei diversas praças. Já beijei através dos olhos. Já consumi através dos sonhos. Será que meu combustível acabará? E de mim nada restará? Talvez. Eu sinto um resquício de amor que ainda não me veio. A minha gramática ainda acredita, mesmo quando eu não acredito.

Antes de voltar a minha casa velha, eu ainda gritei, mais uma vez, despudoradamente, para o Universo:
- Há alguém?
E emudeci. Emudeci completamente: do meu coração à voz. E ainda estou à espera da voz que me responda Sim.


sábado, 4 de janeiro de 2014

Apenas mais uma de amor

Mais uma vez, me sento para escrever sobre amor e dor. Uma dupla inseparável, caminhando uma ao lado da outra, circundando corações apaixonados. Hoje, em mim, não sobrou nada além das cicatrizes que ambos deixaram.

Jogado no fundo do armário existe aquela caixinha com todas as lembranças materiais. E ainda que algo grite dentro de mim "Não faça isso!" a única coisa que consigo pensar é em relembrar os momentos bons. Afinal mesmo lutando para guardar somente os ruins, apenas os melhores permanecem. Todas dentro daquela caixa de madeira trancadas com um cadeado.

E mesmo sem perceber, instantes depois, me pego encarando as melhores lembranças junto dele. Lá dentro haviam cartas que ele me mandara durante anos, declarando seu amor e fazendo promessas. Havia também milhares e milhares de fotos, momentos inesquecíveis e de tamanha felicidade que agora se transformaram em um simples passado que não volta mais. Flores secas e bilhetes de cinema, ursinhos de pelúcia e jóias, porta-retratos e até mesmo algumas roupas que, ao exalar seu perfume, fizeram meu coração apertar. Mas percebo que relembrar todo esse sofrimento e revivê-lo milhares e milhares de vezes faz com que eu me sinta viva novamente. Me fazem pensar que eu fui forte o suficiente para encarar a dor de perder o amor da minha vida e me reerguer com um sorriso no rosto, mesmo que falso. Como um desabafo que precisa ser dito uma última vez para então ser esquecido para sempre. Como o último suspiro que tem de ser dado antes da morte.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Promessas

Sempre me fizera tantas promessas, lembro-me da primeira assim como lembro-me de todas as outras. Nosso amor seria eterno. Me prometeu o sol, a lua e as estrelas. Me prometeu felicidade, amor, cumplicidade. Prometeu também que nunca haveriam brigas ou discussões. Me prometeu tardes preguiçosas e passeios longos. Me prometeu andar na praia de mãos dadas, ver o pôr do sol e caminhar sem rumo. Me prometeu escrever cartas de amor, buquê de flores e café da manhã na cama. Prometeu também fazer cafuné, massagem. Cantar uma música aqui, outra ali, ninar e cuidar do meu sono. Prometeu me pedir em noivado quando eu fizesse 18. Me prometeu um casamento à beira da praia, iluminado com velas, rodeado por flores. Me prometeu lua de mel em Fernando de Noronha. Me prometeu uma casa beira-mar e 4 filhos. Me prometeu conforto e tranquilidade. Prometeu que envelheceríamos juntos. Prometeu que morreria ao meu lado. Mas na verdade o que morreu foram todas essas promessas, junto com nosso amor.