quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Domingo à tarde


Domingo à tarde é um dia clichê para os amantes. Domingo à tarde, sol, sensação térmica febril, companhia, sorvete, parque. Não há dia mais clichê para um casal recém-apaixonado. Ela – garota dos olhos rasos cuja cor escura estremece qualquer encontro ocular perdido no espaço-tempo; corpo de uma palidez que chega a ofuscar quando os raios solares incidem sobre sua pele cuja maciez balança qualquer coração empedernido; seios delicadamente pequenos; anca avantajada; pernas delicadíssimas. A rapariga com cuja voz doce e delicada. Ele – garoto dos olhos perdido; pele áspera; rosto de uma brancura que cuja olheira enxerga-se de longe; pescoço esguio; um corpo magro e delicado, porém atlético; uma voz surrada e cansada.

Era um domingo de dezembro quando o casal recém-apaixonado, cheio de promessas, emanando amor por todos os orifícios do corpo, com juras eternas de amor, arquitetando todos os devaneios para uma vida longínqua e apaixonada, resolveram, pós-almoço, dar uma volta no parque da cidade.

O parque ficava localizado a três quadras do local onde o casal se encontrava. Caminharam silenciosamente. Todo o percurso fora feito de mãos dadas: como se aquelas mãos tivessem sido projetas para encaixarem-se perfeitamente. Era uma sensação de bem-estar, tanto para ela, quanto para ele, estar ligados pela perfeição do encaixe das anatomias: é como dois planetas errantes caminhando a um buraco negro; não há volta.

Chegaram ao parque suando. Ela, com toda delicadeza que uma garota apaixonada, sempre quer estar radiante ao lado do amado. Sentia-se mal por estar com os cabelos perdidos no espaço e estar suando desesperadamente por causa do calor que o azul cristal do céu mandava: apenas algumas nuvens errantes ao céu. Ele percebeu o mal-estar que emanava dos olhos de Karen e disse, Vamos ao banheiro, nos secamos com o papel-toalha que lá se encontra. Ela sorriu e caminharam ao banheiro.

Resolveram dar uma volta de bicicleta. O parque, todo arborizado, lembrava uma floresta: o cantarolar dos passarinhos, o vento balançando os galhos das árvores, as sombras das árvores. Pedalaram por alguns minutos, silenciosamente. Ambos eram pessoas quietas. Após alguns minutos, Karen sentiu-se uma fadiga e disse a Jonas, Amor, vamos parar naquela sombrinha, não há ninguém, podemos sentar um pouquinho e descansar para depois voltarmos. Ele apenas fez um gesto de consentimento com a cabeça.

Deixaram as bicicletas ao chão e à sombra deitaram, lado-a-lado. O lugar estava vazio, apenas o cantarolar dos passarinhos e o soar do vento. Jonas disse, Karen, a vida nos surpreende sempre. Ela o interrompeu dizendo, Sim, mas por que estás me dizendo isso, perguntou. Ele sorriu e disse, Porque eu sou descrente no destino e a vida me colocou uma pessoa muito especial. Ela sorriu deliciosamente e permaneceu em um silêncio saudável por alguns instantes e completou, Realmente, a vida é cheia de surpresas, por mais clichê que isso possa soar, após uma pausa, continuou, Aqueles que estão dispostos a remar nesse mar desconhecido que é o futuro, pode se surpreender com simples gestos que passam despercebidos aos olhos daqueles cuja sensibilidade fora roubada pelo mundo.

Jonas sentiu um calor lhe preencher o peito: como se uma cancela de sangue tivesse sido aberta abruptamente. É como se aquelas palavras proferidas docemente lhe colocassem em um lugar no qual a gravidade não o prende ao espaço físico. Ele sorriu abestalhado. Abraçou-a e tomou-a em seus braços. Por um instante dois corações soaram em uníssono. As suas bocas se encontraram e seus corpos estavam elevados a um estado de serenidade e bem-estar: a lassidão perpétua de um amor recíproco O cantarolar dos passarinhos complementava a música que pairava sobre as suas cabeças, a qual ninguém escutava nem mesmo eles, porém eles sabiam que havia uma música sendo cantada do Universo.

Resolveram, após o encontro dos lábios macios de Karen e os lábios densos de Jonas, voltar a andar com as bicicletas emprestadas pelo parque. Andaram mais alguns minutos, o sorriso desenhado no rosto de ambos quando seus olhos se encontravam por um tênue momento, mostrava que a felicidade era uma casa pequenina no coração gigante de dois amantes. Devolveram as bicicletas e resolveram voltar à casa.

No caminho de volta, resolveram parar numa sorveteria. Karen pediu um sorvete de flocos, Jonas a acompanhou, porém com um de menta com chocolate. Sentaram-se e começaram a saborear o sorvete. Mas, aos olhos do público, eles estavam saboreando o amor. A liberdade que o amor recíproco causa no coração das pessoas. Subitamente, Jonas pensou que a liberdade deste amar uma hora acabaria: todas as promessas, todos os planos para uma vida longínqua, apenas acabaria. Seu coração, subitamente, esmoreceu. Sentiu um mal-estar, mas mesmo assim saboreava alegremente aquele momento. Pois a ausência é um conjunto de presenças não sugadas pelo coração; e ele sugava todas as horas que passava ao lado de Karen. E Karen também aproveitava cada momento ao lado de Jonas.

À porta da casa de Karen, Karen o envolveu em seus braços. Jonas sentiu o calor dos braços de sua amada. Por alguns minutos ficaram se entreolhando, a meia-distância. Aquela sensação de desvendar o que o outro esconde atrás dos olhos, os excitavam. Era um momento de transe. Jonas a beijou apaixonadamente e Karen retribuiu na mesma intensidade que o amor permite. Despediram-se.

Jonas caminhou alguns metros e sentiu um ar gélido lhe correr pela espinha. Olhou para trás e viu que Karen ainda se encontrava ao portão. Voltou bruscamente e lhe disse, Eu quero aproveitar cada minuto ao teu lado, quero envolver-te apaixonadamente em meus braços todas as noites que ainda estão por vir, quero amar-te até mesmo quando todos os nossos momentos que estamos vivendo acabarem. Ela sorriu e era um sorriso de consentimento, de mutualismo. Eles se beijaram como se aquele fosse o último beijo dos amantes.


Domingo à tarde é feito para os corações apaixonados, nada mais.

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